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Dilma e a Carta aos Carolas

No dia 22 de julho de 2.002 o então candidato à Presdiência Luis Inácio Lula da Silva publicou uma carta-compromisso, que ficou conhecida como Carta aos Brasileiros, na qual se comprometia com o não rompimento dos contratos e a manutenção da política econômica que herdaria do governo FHC.

A declaração deu ao candidato a densidade que faltava para domar preconceitos que ainda assustavam o empresariado e a classe média do País. Lula ganhou o jogo, sepultando as desconfiaças e suspeitas lançadas então por seus adversários políticos.

Nesta sexta-feira, a candidata do presidente lançou mão do mesmo artifício para tentar conter suspeitas de outra natureza — especialmente as de que ela seria defensora da descriminalização do aborto, imputação que Dilma Rousseff tem tratado como calúnia.

Em sua Carta aos Carolas, Dilma uma vez mais se perde na confusão de palavras lançadas ao vento que, ainda que servissem para amenizar-lhe as críticas, colociam a candidata diante de outro problema: a falta de coerência.

A declaração de Dilma aparece eivada de imprecisão, tomando-se como referência manifestações dela própria. Ao apresentar sua posição pessoal sobre o tema, anuncia que é “pessoalmente contra o aborto”.  Em seguida, na mesma frase, a candidata petista assegura que defende “a manutenção da legislação atual sobre o assunto”.

A primeira assertiva não diz nada. O que está em questão não é defender o aborto, como se alguém estivesse na iminência de torná-lo compulsório. É a defesa da descriminalização da interrupção da gravidez. Declarar-se “contra o aborto” é tautologia pura porque ninguém pode ser simplesmente “a favor” dele. Uma redução, como pretende o comando da campanha, para lançar o assunto na seara das “infâmias” e “calúnias”.

A afirmação soa como insicera — pelo menos à luz da história e das manifestações de Dilma Rousseff. Em pelo menos duas oportunidades ela se declarou favorável à descriminalização, posição quase unânime entre as feministas de todo o planeta. Foram declarações espontâneas, forjadas no dcorrer de dois encontros diferentes com jornalistas.

Para quem como eu acha que a definição do futuro do País não pode passar por essa discussão medieval, a nítida contradição entre o que foi dito no passado recente e as manifestações de Dilma agora produz um efeito ainda pior do que o gerado pela discussão da temática religiosa. É a desconfiança.

Que consistência poder ter um candidato que troca seus valores em função de conveniências eleitorais ? Como pode alguém pensar de duas formas tão diferentes sobre o mesmo assunto ? O que mais a conjuntura pode alterar nas convicções absolutas da candidata ?

O texto pobre e mal-ajambrado da Carta aos Carolas, de tão pífio, pobre e impreciso, nem de longe se parece com a carta firmada pelo artífice de Dilma oito anos atrás. Aquelas eram as bases fundadoras de um projeto que desaguou no governo mais popular da história. Esta, apenas uma tábua de salvação para estancar uma circunstancial hemorragia de votos — se é que ainda há a tal hemorragia.

Bom seria se os redatores do documento tivessem prestado atenção ao que escreveram no último parágrafo: “Não podemos permitir que a mentira se transforme em fonte de benefícios eleitorais para aqueles que não têm escrúpulo de manipular a fé e a religião tão respeitada por todos nós”.

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