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Sérgio Cabral e o Baile da Ilha Fiscal

No dia 9 de novembro de 1889, a Corte brasileira se reuniu para um histórico regabofe na Ilha Fiscal. Ao chegar, Dom Pedro II levou um escorregão e quase foi ao chão. Bem-humorado, cunhou uma frase que demonstrava, claramente, o quanto ele estava mal informado sobre a situação política do País: “O imperador quase caiu, mas a Monarquia continua firme!”

O Baile da Ilha Fiscal foi uma farra memorável. Para alimentar e embriagar a nobreza, os cortesãos e os demais comensais,  consumiram-se  800 kg de camarão, 1.300 frangos, 500 perus, 64 faisões, 1.200 latas de aspargos, 20.000 sanduíches, 14.000 sorvetes, 2.900 pratos de doces, 10.000 litros de cerveja, 304 caixas de vinhos, champagne e bebidas diversas.

Seis dias depois, Dom Pedro e toda a Corte foram depostos pela Proclamação da República. A monarquia, como a história mostrou, não estava  “firme” como o ex-monarca quis fazer crer na antevéspera de ser golpeado.

Entre a esbórnia da Ilha Fiscal e a de Sérgio Cabral em Paris  passaram-se exatos cem anos. Mas esse século inteiro não foi suficiente para que as autoridades do Rio aprendessem que farras memoráveis são, quase sempre, prenúncio de mau-agouro.

Cabral tem antecedentes em seu próprio governo. Quando chuvas torreciais do reveillon de 2010 derreteram os morros da Ilha Grande e  Angra dos Reis, o governador estava desaparecido. Ficou ausente por mais de 30 horas enquanto a população agonizava sob a lama. Até hoje, não se sabe ao certo onde Sérgio Cabral esteve enquanto o vice-governador Pezão tentava preencher a lacuna, que não passou despercebida.

O escândalo que as fotos divulgadas por Garotinho evidenciam, uma espécie Fête de l’île Fiscal de Sérgio Cabral, não consta da agenda do governador. No dia em que foi fotografado ao lado de Fernando Cavendish no show do U2 em Paris, Sérgio Cabral estava, ao menos oficialmente, no Rio de Janeiro. Como estava no derretimento das encostas da Serra do Mar.

O site do Diário Oficial do Rio de Janeiro é uma espécie de conspiração eletrônica contra a transparência. Ali só é possível consultar as últimas 30 edições. Quem quiser acessar o passado precisa comparecer pessoalmente ao Arquivo Público do estado —  em plena era da Sociedade da Informação.

Apesar disso, não é difícil constatar que Cabral desaparece do noticiário de sua própria assessoria de imprensa em 10 de julho de 2009, a sexta-feira que antecedeu o malsinado show. Naquele dia, o governador visitou duas cidades da Baixada. Expôs-se em compromissos oficiais de caráter público. E mergulhou na ubiquidade de sua misteriosa agenda interna por toda a semana seguinte.

Não é possível saber se solicitou ou não autorização à Assembléia Legislativa para se ausentar do País naquele momento.  As notícias publicadas no site do Governo do Estado do Rio dão conta de pelo menos um compromisso ao qual um governador não faltaria — se estivesse presente na cidade e bem de saúde. Foi a comemoração do centenário do Teatro Municipal, um grande evento cultural que reuniu nomes importantes na Cinelândia na noitede 14 de julho de 2009.

Milhares de pessoas se aglomeraram para ver o Maestro Roberto Minczuk regendo a orquestra do próprio teatro, ouvir  o tenor argentino Marcelo Alvarez e a soprano sul-coreana Sumi Jo, e apreciar a coreografia de  Ana Botafogo e Francisco Timbó para um trecho de Floresta Amazônica, de Heitor Villa-Lobos.

Naquela noite Cabral estava em Paris, bem longe do centro do Rio de Janeiro, jantando em companhia dos amigos do guardanapo, numa farra memorável. Quem o representava junto à plebe reunida defronte ao Municipal? O inexpugnável Pezão que, nas ausências inexplicadas do titular, vai tocando a administração do Rio.

Demorou três anos para que a festa da turma de Cabral criasse a indignação que o Baile da Ilha Fiscal criou em seis dias.

A República não caiu — o que caiu foi o queixo do eleitor com o comportamento fanfarrão de seu governador.

Pedro II não teve tempo de explicar seu regabofe. Sérgio Cabral tem de sobra. Entre uma e outra ida a Paris, talvez lhe seja conveniente fazer uma escala em Brasília para explicar com que dinheiro sustenta suas viagens, quem paga as contas e que tipo de assunto é tratado durante as farras internacionais.

A menos que pense que está firme demais, assim como um dia pensou nosso último imperador.

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