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Lula escolhe o jato mais caro

IGOR GIELOW

Se fez uma escolha que tem sustentação na lógica de uma parceria mais ampla com a França, é verdade também que o governo Lula escolheu o modelo mais caro entre os três em disputa para reequipar a frota de combate da Força Aérea. 
Preço de avião é assunto complexo, pois o produto não vem com uma etiqueta. Os valores dependem de muitas variáveis, como os armamentos escolhidos, a logística oferecida e o treinamento de pilotos, engenheiros e mecânicos. Num acordo maior, como era o F-X2, toda a questão de compensação industrial e comercial e transferência tecnológica influi no preço final. 
Isso dito, o Rafale chegou à fase final da disputa com um preço unitário na casa dos US$ 140 milhões, praticamente o dobro do sueco Gripen e 40% mais caro que o F-18 americano. Os valores naturalmente podem mudar com novas negociações. Outro problema do Rafale é o de escala industrial, que talvez comece a ser resolvido para os franceses justamente se a venda para o Brasil for fechada. 
O Rafale é um avião que apenas a França usa, tendo 136 unidades entregues de 2000 para cá. Fracassou em todas as concorrências internacionais até aqui que disputou, embora tenha boas perspectivas de venda aos Emirados Árabes Unidos. O problema disso é que o produto fica mais caro ao longo do tempo, com menos unidades no mercado mundial. Os argentinos sabem disso: foram os únicos compradores de modelos franceses Super Étendard em 1980 e até hoje têm dificuldades para mantê-los. 
Do ponto de vista estritamente militar, o Rafale é considerado um bom e moderno avião, ainda que seja o mais antigo de sua geração. Na avaliação final, pesava contra os americanos a suspeita justificada sobre a segurança futura do projeto: ainda que o F-18 seja um avião de sonhos para pilotos, sempre haveria o risco de o Congresso ou outra gestão na Casa Branca mudar de ideia sobre o fornecimento de tecnologia ao Brasil. Para os suecos, com um programa muito elogiado na FAB, havia dúvidas sobre o caça em si -a versão oferecida não existe na prática ainda. 
Mas esse debate pode ser inócuo, já que não ficou claro até aqui o papel reservado à FAB na escolha. Depois de tocar um processo tão transparente quanto possível e, raridade, dentro do prazo, os militares se viram excluídos do anúncio de ontem. No relatório que não haviam apresentado ao Ministério da Defesa, não iriam de todo modo escolher só um dos aviões. Elencariam virtudes e problemas de cada projeto. 
Mas nem isso ocorreu. Haverá muita reclamação de bastidor, mas, se realmente o Brasil vai comprar um caça, é de apostar que nenhum brigadeiro irá se queixar publicamente. Eles demandam um avião novo desde a década de 90, quando os Mirage-IIIEBR já começavam a caducar. Os concorrentes também irão chiar, mas na prática não há quase nada que possam fazer. 
Por fim, haverá sempre a dúvida sobre a escolha dos franceses como parceiros estratégicos. A dependência de um só fornecedor em várias áreas (submarinos, helicópteros, caças) traz vantagens, mas também fica a dúvida sobre o futuro no caso de uma mudança de ventos no Palácio do Eliseu. Cabe lembrar que não há nada assinado ainda, e a forma atabalhoada do anúncio não ajudou muito. O acordo dos submarinos demorou meses para tomar forma entre o anúncio da intenção e a assinatura. Ainda haverá muitos capítulos antes do fim da novela.

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