Blog do Pannunzio

Leia aqui o artigo que motivou a ação de Riva contra a presidente do Sindicato dos Jornalista de MT

Os últimos coronéis

 

 

 

Por Keka Werneck, publicado no Blog Página do E em 15/10/2009

 

 

Homem baixo, de mais ou menos um metro e meio, branco, careca, sorridente, 50 anos. Trata um câncer. Essa é a descrição física imediata, simplista, de José Geraldo Riva, deputado estadual e presidente da Assembléia Legislativa de Mato Grosso (AL-MT) pelo Partido Progressista (PP-MT). Em três décadas o ser aparentemente frágil se transformou em um dos “capas” mais poderosos do Estado, rico e forte politicamente, respaldado por todos os governos os quais atravessou. Riva, apesar de franzino, tem estatura. E a fama dele corta o inconsciente popular como aquele contra o qual melhor não dizer ou fazer nada. A imprensa quase não o incomoda. Seus pares logo sucumbem ao modo “zerriva” de administrar, prática inclusive que o coloca em um pedestal quase intocável. Isso em si já indica que descrevê-lo é algo mais amplo que detalhar a conformação física. A ascensão de Riva se dá em um campo tão complexo quanto o tipo de política eleitoral que ainda se faz em rincões do país. Para falar dele, impossível não citar, ao menos, a dicotomia bem e mal. Já que Riva, como se diz por aí, trabalha. Como se isso fosse predicado a se gabar. É que o mundo parlamentar tem desses eufemismos. Mas trabalha para quem? Riva é pecuarista e defensor claro dos madeireiros de Mato Grosso, o Estado brasileiro que mais põe árvores abaixo (variando entre o primeiro e segundo lugar com o Pará). E para que? Abrir pastos e lavouras, principalmente das monoculturas da soja e algodão, à revelia do grande último tesouro da humanidade: a Amazônia. José Geraldo Riva é, para além de tudo isso, um dos últimos coronéis.

Já faz tempo que o nome dele corre nos bastidores como símbolo de impunidade. O Ministério Público Estadual (MPE) já acumula mais de 100 processos contra Riva, por todo tipo de crime, em especial crimes contra os cofres públicos. Ele é o parlamentar mato-grossense mais processado.

Na sexta-feira, 2 de outubro, uma notícia correu feito raio por caminhos alternativos; não por meio da imprensa, que sabe como ninguém fazer alarde, quando quer. Mas de boca em boca e pela internet. O juiz Luiz Aparecido Bertolucci, da Vara Especializada em Ação Civil Pública e Ação Popular de Mato Grosso, cassou direitos políticos de Riva, obrigando-o a devolver aos 3 milhões de habitantes do Estado R$ 2.656.921,20 milhões. Isso o coloca na condição de condenado por corrupção.

E agora José?

A decisão do juiz já fez surgir uma campanha popular Fora Riva!, nos mesmos moldes da campanha Fora Gilmar Mendes! (presidente do Supremo Tribunal Federal) – de Diamantino, interior de Mato Grosso.

Nesse processo em específico, José Riva não está só. É réu solidário o também deputado estadual Humberto Bosaipo (PP-MT) e outros citados.

Ficou provado, na opinião do Juiz Bertolucci, que a Assembléia Legislativa, sob a presidência de Riva, emitiu durante 15 meses (agosto de 2001 a dezembro de 2002) cheques em favor da empresa Sereia Publicidade Ltda. Segundo o juiz, notas frias para justificar o estorvo ao público. Ainda conforme o juiz, “a ninguém pode passar despercebido o vulto dos valores, a maneira inédita e a periodicidade anormal dos pagamentos”, feitos em até mais de um no mesmo dia. O juiz destacou uma curiosidade: “um dos cheques foi emitido no dia de Natal”.

Essa decisão deve ter feito comemorar o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que em Mato Grosso tem a marca de Antônio Cavalcante, o Ceará. E o pessoal da Moral, entidade que milita pela moralização do uso do dinheiro público, puxada pelo jornalista e servidor federal Ademar Adams. Os dois movimentos têm em Riva um foco de atuação cotidiana.

E o que caracterizaria José Riva como coronel? Por exemplo, o cabresto intelectual que ele exerce na mídia. Cuiabá é a capital de Mato Grosso. Tem três ditos grandes jornais, outros dois menores. Dois sites que reproduzem o modelo factual de noticiar. Alguns blogues. A informação sobre a condenação de Riva seria certamente manchete, dentro da lógica dessa mídia clássica; disputaria ao menos lugar de destaque. Na sábado a notícia, que havia circulado informalmente na sexta, não estava estampada. Na TV Centro América, afiliada da Rede Globo em Mato Grosso, também não deram matéria sobre isso. Valeria a inflexão insistente de criança de 7 anos: por que será? No domingo, muito pouco saiu nos jornais, só em cantinhos. E para achar notícias sobre a condenação de José Riva nos sites seria necessário persistir.

A assessoria jurídica do deputado, estranhamente, não recorreu de imediato desta decisão. A condenação saiu há 10 dias. A sociedade mato-grossense aguarda o desenrolar desse caso legendário. Essa mesma sociedade que assistiu boquiaberta, tempos atrás, à prisão do bicheiro João Arcanjo Ribeiro.

 

Keka Werneck é jornalista em Cuiabá, presidente do Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso.

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