JOSÉ LUIZ NIEMEYER DOS SANTOS FILHO, na Folha de São Paulo A discussão das últimas semanas, referente às ácidas cartas de setores da reserva...

JOSÉ LUIZ NIEMEYER DOS SANTOS FILHO, na Folha de São Paulo

A discussão das últimas semanas, referente às ácidas cartas de setores da reserva das Forças Armadas sobre o processo de criação de uma Comissão da Verdade, coloca um ponto importante para nossa reflexão. Quem pensou, organizou e operacionalizou o movimento de 1964?

A resposta soa clara ao aluno desatento do ensino médio: militares. Mas não. A participação ativa dos setores civis da sociedade no golpe militar de 31 de março de 1964 deve ser discutida e aprofundada, inclusive naquilo que se refere à tortura e ao desaparecimento daqueles que se opunham ao regime. Não se muda a história.

A participação civil nos regimes ditatoriais é regra quando se observa alguns dos processos históricos contemporâneos. Além dos militares e dos serviços secretos, sempre há aqueles grupos civis que incentivaram a ruptura institucional a partir do uso da força militar.

Foi assim no movimento de ascensão do nazismo na Alemanha, do fascismo na Itália e do comunismo na antiga União Soviética. É padrão: o setor conservador e radical das Forças Armadas se ancora no meio civil como braço auxiliar para a ação de poder. E tão grave quanto: os setores civis, principalmente das elites empresariais conservadoras, utilizam-se da caserna para manterem privilégios e garantirem novas regalias.

O grande historiador Tony Judt, no épico “Pós-Guerra” (no Brasil, disponível pela editora Objetiva), mostra essa aproximação difusa e obscura entre civis e militares nos projetos de tomada do poder à força na história contemporânea. Quando a ministra de Direitos Humanos Maria do Rosário menciona a importância de elucidar a participação dos setores e grupos civis nos processos de radicalização do regime de 1964, ela está certa.

Se os excessos cometidos pelos radicais de farda ocorreram, é necessário ressaltar que eles aconteceram também por incentivo e por interesse desses grupos. Vale lembrar que a deflagração do golpe militar de 1964 foi precedida por uma movimentação da classe média paulista (a chamada “Marcha com Deus Pela Liberdade”, que foi organizada também por grupos ligados às grandes empresas de São Paulo).

O ano de 1964 é também resultado do apoio irrestrito dos chamados “capitães da indústria” de São Paulo e dos representantes mais conservadores das oligarquias agrárias do Nordeste à época. São grupos civis, com origem ligada ao empresariado, que frequentavam recepções de congraçamento entre civis e militares, gabinetes governamentais e ambientes acadêmicos ideológicos, como a Escola Superior de Guerra -chamada pelos próprios “estagiários” mais envaidecidos de “Sorbonne brasileira”, que viam no golpe de 1964 uma oportunidade única.

Essa oportunidade se baseava em uma estratégia que foi regra mestra no desenvolvimento econômico do período: o arrocho salarial para manutenção dos ganhos de capital, agenda decisiva para a manutenção do patamar de lucratividade dos investimentos nacionais e internacionais no período após Juscelino, de rápida industrialização do país. Mas o incentivo para o golpe e o decisivo apoio durante boa parte da execução do regime de 1964 não ficam restritos a essa ação quase “institucional” dos grupos civis que se fundiam aos interesses dos militares mais radicais à época.

Mais graves foram as ações pensadas e organizadas diretamente por grupos civis radicais, como o obscuro “Comando de Caça aos Comunistas”, a “Operação Bandeirantes”, entre outras, que foram conduzidas a partir de ações clandestinas, com o apoio dos serviços secretos militares e das lideranças e grupos empresariais à época.

Esperemos que, se criada, a Comissão da Verdade, de alguma forma, também possa se deter nesta seara que envolve uma segunda sombra do regime de 1964.

JOSÉ LUIZ NIEMEYER DOS SANTOS FILHO, 45, doutor em ciência política pela USP, coordena o departamento de relações internacionais do Ibmec-RJ (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais)


  • Jacutinga

    28/03/2012 #1 Author

    Prezado Sr. Dr. Cientista Político:
    Concordo com o Sr quando afirma que não se muda a verdade. A verdade não se muda, mas, pode sim, ser omitida, distorcida ou interpretada. Concordaria plenamente se hovesse dito que não se muda a REALIDADE DOS FATOS OU A OCORRÊNCIA DE FATOS EM ORDEM LÓGICA . Interpretação da verdade é coisa comum. Mas, fatos são definitivamente fatos. O ideal é que a verdade seja igual ao fato dentro da lógica. Entendo que o Dr não esteve presente à época dos acontecimentos que comenta. Evidentemente, o conhecimento que obteve foi por ouvir dizer de mestres esquerdistas com suas interpretações de suposta verdade ou por estudar em livros comprometidos apenas com uma visão parcial (não imparcial) dos acontecimentos ocorridos na realidade.
    Evidentemente os civis participaram do movimento contra revolucionário, mas não no contexto apresentado. Vou fazer em seguida algumas observações de quem viveu à época , e aproveito para desculpar-me pelos erros gramaticais (tenho só ensino médio NÃO desatento, mas cursado a mais de 50 anos) e, pela simplicidade e obviedade do texto que fiz para que ficasse bem compreensível , aos “desatentos”alunos do ensino médio, a quem também me dirijo para que passem a ficar atentos.
    Culpar militares , e pior que isto, culpar civis pela contra revolução de 1964, é o mesmo que condenar um bombeiro que molhou um caríssimo móvel que pegava fogo, ou a um médico que amputou um dedo gangrenado. Ninguém aprova uma amputação, mas, se ela é a condição para a continuidade da vida, o que fazer? Seria admissível condenar o médico por não tratar convenientemente a inflamação original do dedo, por amputação prematura antes de esgotar todos os recursos ou ainda por amputar além do dedo a mão , sem a menor necessidade. Muito didáticamente (para os de ensino médio como eu), os civis notaram a inflamação no dedo, puseram pirão de farinha quente, passaram mercúrio cromo e iodo, pomada e tomaram antibiótico. Ao ocorrer a gangrena, recorreram ao médico que efetuou a operação e tomou conta do paciente. Querem saber os sintomas da “inflamação”? Tudo o que vou informar, é facilmente comprovável, a pura verdade e os fatos plenamente conhecidos (mas pouco divulgados)
    O Brasil era governado por um presidente fraco , temeroso, influenciável que havia sido eleito vice presidente apenas por conveniência e estratégia política. Sua postura política e pessoal era publicamente ridicularizada. Era sempre o último a saber, em todos os sentidos;
    Sua posse foi conturbada e logo depois foi completamente dominado por seu cunhado Leonel Brizola, indivíduo interesseiro, invejoso e oportunista;
    Desde 1961, dezenas de brasileiros foram fazer um curso em Cuba. Curso de que? Guerrilha! Para que ? Para fazer uma revoluçao socialista (comunista) no Brasil;
    Milhões de dólares repito MILHÕES de dólares foram enviados via Cuba (testa de ferro da URSS), para financiar os movimentos guerrilheiros que se armavam e se estabeleciam no Brasil (Grupos dos 9, grupos dos 11, VAR, MR8, ligas camponesas e outros).. Após março de 64, o dinheiro ainda não gasto , foi usado para comprar armamento, devolvido a Cuba (F G do MR8) e comprar fazendas no Uruguai e Austrália (El Raton). Pergunto para que o envio de tal quantidade de dinheiro, treinamento de guerrilha e compra de armas? Evidentemente para iniciar no Brasil uma revolução socialista (comunista tipo Cuba); O dinheiro enviado via Cuba também financiava estudantes, sindicatos, jornais e jornalistas, políticos, religiosos (teoria da libertação, Boff, Beto, Casaldaglia e etc). E o presidente, bovinamente assistia a tudo isto sem nenhuma atitude. Sempre o último a saber;
    E fomentavam a indisciplina e quebra de hierarquia nas forças armadas e foram intensificando os treinanamentos e se armando. O movimento sindical promovia greves e paralizações, estudantes se rebelavam e as ligas camponesas invadiam terras;
    Para o dia 13 de março o presidente, influenciado e incentivado temerariamente pelo cunhado Leonel Brizola convocou um comício em frente à estação ferroviária Central do Brasil, ao lado do ministério da guerra (exército), no Rio de Janeiro e , nas seguintes circunstâncias: Dia de semana às 18:00 Hs, horário de maior movimento na estação, ponto facultativo, mobilização estudantil e sindical, trens parados e centenas de onibus colocados à disposição. Intensa panfletagem e divulgação em rádio TV e jornais, tanto no Rio quanto em cidades vizinhas. Foram reunidas entre 130 e 150 mil pessoas. Neste discurso, João Goulart fez declarações realmente revolucionárias. Sem consulta ao congresso, decretou a reforma agrária com desapropriações e encampação das refinarias particulares SEM prévia indenização. Prometeu reforma política com a criação de constituinte formada por trabalhadores, estudantes, sindicalistas e sargentos, reforma educacional e reforma tributária . Mas, o mais grave, declarou não aceitaria o uso de rosários como arma para impedir as reformas, prestou apoio total aos fuzileiros navais que quebraram a hierarquia militar e exortando o povo a rebelar-se , prometeu sangue a quem colocasse barreiras que impedissem o que desejava. O perigo e a ameaça de uma próxima revolução socialista (comunista) era evidente e iminente. Neste momento, a inflamação virou gangrena. E, a maioria silenciosa com quem Brizola pensava contar, foi às ruas em várias capitais contra as idéias do presidente. No dia 19 de março em São Paulo, sem distinção de elite, classe média ou operários, juntaram-se 500 mil pessoas na Marcha da Família com Deus pela Liberdade. Mobilização prévia quase nenhuma só da Igreja Católica e de alguns políticos.
    Notem bem ! O discurso presidencial do dia 13 de março provocou a reação civil E a reação militar. As forças armadas que são o povo em armas , com incentivo popular agiu;
    Era o chamado que o médico esperava para amputar o dedo gangrenado e salvar o paciente enfêrmo;
    O 31 de março foi um dia extremamente tranquilo. Nenhum confronto, nenhum tiro e nenhuma morte sequer, em todo o Brasil, de Norte a Sul. Noventa por cento da população apoiou a mudança de governo. Apenas dois dias depois da intervenção militar, reuniram-se UM MILHÃO de pessoas na Av Rio Branco no Rio de Janeiro na Marcha da Liberdade com Deus pela Família.
    Quando o Sr Dr Cientista Político pergunta quem pensou, organizou e operacionalizou a intervenção militar, juro não saber e também não ter a mínima curiosidade a respeito. Mas, quem a provocou, isto posso afirmar com toda certeza foi a tibia atitude do Sr Goulart e a sede imensa de poder do Sr Leonel Brizola querendo implantar o socialismo “moreno”como dizia. Os civis e militares agiram em legítima defesa.
    Quanto a tal comissão da “suposta”verdade, esclareço aos assim chamados “desatentos” estudantes que TODOS os mortos e desaparecidos nos 20 anos de governo militar, não representaram por ano nem 0,00005 % da população brasileira. Morreram em 20 anos mais pessoas no Brasil de “bicho de pé” do que os mortos e desaparecidos no período militar !!! Na verdade, não deveria haver morrido ninguém, mas, infelizmente houveram assaltos a banco, sequestros , roubos, enfrentamentos policiais, guerrilha armada e atentados terroristas. Aconteceram abusos e excessos dos dois lados do enfrentamento. Afirmo com toda certeza, que aqui no Brasil foram entre 450 e 600 as pessoas vitimadas em 20 anos de governo militar. Quantos seriam os mortos em caso de uma revolução socialista vencedora? Em Cuba , um país minúsculo foram dezenas de milhares de mortos, na URSS foram centenas de milhares e no Kmer vermelho, milhões . Quantos seriam no Brasil ?? Melhor amputar um dedo gangrenado do que arriscar a vida.
    Para terminar, pergunto aos que vivem do passado : Se não querem e não necessitam de mel e não querem cera, por que motivo incomodar as abelhas ? Deixem o passado para o passado. Olhem para frente. Deixem os que erraram e os que acertaram, tanto de um lado quanto do outro, viverem e terem em suas consciências seus pecados ou os seus acertos. Deixem os mortos tanto de um lado quanto do outro descansarem em paz ! Preocupem-se com os vivos no presente e com o seu futuro. E, para encerrar, aprendi na física do segundo grau, que a toda ação corresponde uma reação igual e contrária, não é colegas “desatentos”? Deixem as coisas quietas.
    Sr. Dr Cientista Político, desculpe meu abuso e ouça o conselho de um velho quase rabujento: Não se deve querer apagar fogo colocando gasolina. Em vez de colocar mais lenha na fogueira, deixe o fogo se apagar em PAZ, por favor!!
    Jacutinga

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