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Massacre do Jacarezinho é terrorismo bolsonarista

Na última quinta-feira, o presidente da republiqueta começou sua live semanal manifestando pesar por um episódio que comoveu o País: o ataque à escola de Saudades, SC, em que um desequilibrado matou cinco pessoas.

“Se ele morrer, não vou achar ruim não!”, exclamou o chefete da republiqueta diante de uma plateia atônita com outro crime muito mais grave — a carnificina promovida pela polícia civil de Rio de Janeiro na favela do Jacarezinho.

Ninguém espera mesmo que Bolsonaro tivesse uma reação humana diante de um crime praticado por policiais. Mas o anátema contra o assassino de Saudades foi a nota funesta no fim do dia mais triste e violento da história do Rio. A chacina de Jacarezinho, no entanto, não mereceu uma palavra sequer de Bolsonaro.

Em nome do governo, falou o General Mourão: “’tudo bandido”, disse o vice-presidente da republiqueta muito antes que a identidade dos mortos fosse conhecida.

Como ele sabia? Simples! Todos eram pretos, pobres e moravam numa favela, que é o espaço urbano reservado pela republiqueta aos pretos e pobres ( este sim um pleonasmo abusivo!).  Faltou pouco para que Mourão chegasse à conclusão inelutável de que o massacre, na verdade, foi uma catarse encerrada com o suicídio coletivo de 27 pessoas e a morte cruel de um policial.

As primeiras informações sobre o que motivou a chacina vieram pela boca do chefe dos carrascos que tocaram o terror no Jacarezinho. “A Polícia Civil não vai se furtar de fazer com que a sociedade de bem tenha seu direito de ir e vir garantido”, afirmou o delegado Rodrigo Oliveira, repetindo um mantra sagrado do bolsonarismo.

A ‘sociedade de bem’. O direito de ir-e-vir num local em que nenhum outro direito assiste à população. É possível ouvir a voz de Bolsonaro soprando no ouvido dos policiais a senha ideológica para que os jagunços da milícia civil fluminense fizessem o que fizeram.

O mesmo delegado apontou a outra causa do mal, de acordo com suas lentes: o ‘ativismo judicial’. Que ativismo judicial? Certamente o do ministro Fachin, do STF, que proibiu liminarmente execuções e chacinas durante a pandemia. Apesar dos quase mil assassinatos ocorridos desde a proibição, as hienas estavam com sede de sangue. E não era apenas para saciar seu sadismo. Havia um sentido político na ação.

Nos últimos dois anos, o País viu avultar movimentos, sempre liderados pela falange presidencial, na direção da ampliação do direito de matar. Eles já fizeram grandes conquistas. Provocaram um aumento exponencial do número de armas, do direito de portá-las e a autorização expressa de colocar na alça de mira inimigos ideológicos.

O próprio Bolsonaro, no dia do massacre, recomendou o assassinato de trabalhadores sem terra ao comemorar uma de suas maiores obras até aqui, a autorização para que fazendeiros portem indiscriminadamente armas dentro de seus glebas.

“Ele pode [agora] montar no cavalo, pegar o seu carro e andar por toda a sua fazenda armado. E se encontrar o ilícito lá, mete fogo, porra!”, recomendou Bolsonaro ao se referir a João Pedro Stédile, o líder do MST, movimento que o primeiro-mandatário da republiqueta desrespeitosamente chama de “vagabundos”. E tudo isto horas depois da chacina do Jacarezinho.

O culto à morte e a legitimação do massacre como forma de controle social, no entanto, não são fins em si mesmos. São táticas para a imposição de uma hegemonia fascista que já está confortavelmente instalada no controle da republiqueta.

Qualificado como ‘dano colateral’ pelos insufladores da onda neofascista que varre o Brasil, o massacre no Jacarezinho foi na verdade uma inequívoca demonstração de força do bolsonarismo – especialmente do que ele é capaz, em sua escalada de brutalidade e selvageria.

O Brasil dos dias de hoje é uma republiqueta com instituições profundamente infiltradas pelo pensamento bolsonarista. A contaminação das polícias é clara e inequívoca.

Nas últimas semanas, PMs de Brasília prenderam manifestantes que chamavam o Genocida de genocida; agentes penitenciários torturaram Rodrigo Pilha, um desses manifestantes; PMs de Belo Horizonte invadiram e prenderam sem mandado moradores falsamente acusados de jogar ovos em Bolsonaro; e a polícia federal saiu à caça de indígenas, jornalistas e advogados brandindo contra eles a famigerada Lei de Segurança Nacional.

É este o éthos em que a ação dos assassinos da polícia civil do Rio de Janeiro deve ser compreendida. Ela cria um símbolo de pavor, mostrando claramente do que os soldados da grande milícia bolsonarista são capazes de fazer pela ‘sociedade de bem’.

Trata-se do mais rematado terrorismo. Porque é assim mesmo que o terror se impõe, criando símbolos de perversidade e crueldade que apavoram e desorientam a população.

Embora possa parecer paradoxal, dadas as relações pessoais e familiares do presidente da republiqueta com milícias e milicianos, o objetivo dessa política do terror é a tomada do Poder. Não mais do Poder institucional legitimamente conquistado, e sim do Poder absoluto, sem nenhuma trava ou limite.

A democracia, esse cristal precioso que a Nação vem lapidando desde o fim da ditadura, está sendo dilacerada a olhos vistos sem que ninguém faça nada para conter o processo de corrosão institucional. Ela é a maior das travas a serem removidas.

É por isto que o presidente da republiqueta vocifera a todo momento que está a urdir um decreto para promover uma intervenção militar formal – a despeito de o governo ser de um ex-tenente do Exército, nove de seus ministros serem militares e mais de 6 mil oficiais terem sido assentados em funções civis.

E o que seria esse governo proveniente da intervenção sonhada por Bolsonaro? Alguém acredita que seria necessário trocar um mísero ministro para que a ditadura bolsonarista fosse finalmente instaurada? Não!

A ditadura bolsonarista seria o mesmo governo constitucional, mas com a autorização expressa do ditador para a caça desenfreada aos inimigos políticos, o expurgo dos movimentos de afirmação identitária, o cerceamento da liberdade de informar e a prática sistemática do extermínio de todos aqueles que se interponham no caminho do tirano.

Os carniceiros do Jacarezinho cumpriram um importante papel na construção desse ambiente. Eles deixaram claro quem é que manda e quanto estão dispostos a fazer por seu líder. E ainda afrontaram o STF, odiado por Bolsonaro.

Também explicitaram uma hierarquia que perpassa o organograma formal das instituições policiais. Que as sintoniza com um comando maior, quase invisível, ao qual também se subordinam os PMs de Minas e de Brasília, e os policiais federais que andam constrangendo jornalistas e advogados com a LSN.

É este o Brasil que o massacre do Jacarezinho desvela. O Brasil do pé na porta, do banho de sangue, da execução sumária, do tiro na nuca. O Brasil segregado – pretos e pobres de um lado, sociedade de bem de outro, e uma milícia mortífera pronta para fazer a balança pender para o lado branco do problema.

Pronta para calar também os inimigos do Grande Déspota – artistas, jornalistas, advogados, indígenas, sem-tudo,  juízes, comunistas, gays, ambientalistas e toda a fauna que ousar contestar a justeza da tirania do Incontestável.

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