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Moro errou. Errou mesmo?

A polêmica não tem sentido. Basta ler a Lei da Interceptação Telefônica (Lei 9296/96) para se constatar que Sérgio Moro, um juiz eficiente e assertivo, desta vez pode ter  produzido uma ilegalidade.

O primeiro parágrafo da lei 9296/96 estabelece que “a interceptação de comunicações telefônicas (…) dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça“.

Em outro ponto, no Art. 8º, o texto legal determina que a interceptação  “ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas“.

O Art. 9º estabelece que “a gravação que não interessar à prova será inutilizada (…) em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada”.

O juiz Sérgio Moro mandou abrir o sigilo, apensou as transcrições e áudios ao inquérito e deixou de inutilizar o que não interessava para as investigações. Na minha opinião, errou — ao menos do ponto de vista formal.

Esse erro pode leva-lo ao CNJ e certamente dará muita munição para seus vários desafetos — entre eles quase toda a nomenklatura da advocacia brasileira, inconformada ainda com essa nova figura encarnada por Moro, o “juiz de ataque”.

Mas não invalida a prova. E é isso o que importa.

Foi um erro absoluto ? Não firme certezas absolutas ainda.

O que os áudios provam é que havia uma conjuração para transformar a Presidência da República em uma espécie de bunker inexpugnável no qual Lula estaria a salvo das ações da Justiça Federal.

Essa conjuração envolveria diretamente a presidente Dilma Rousseff e os mais importantes de seus axilares. Também o presidente do Partido dos Trabalhadores e causídicos que, na ausência de outros métodos mais eficientes, tramavam estratégias antijurídicas de defesa do ex-presidente e outros anjos petistas caídos.

Essa turma não costuma respeitar promotores e juízes. Esta afirmação não é opinião do autor deste texto, é um fato inquestionavelmente bem documentado nos sacrossantos grampos legais (divulgados ilegalmente, eu diria). Basta ler a transcrição da conversa que Lula teve com o senador Lindberg Faria (PT/RJ) no dia 2 de março às 9h13.

“O problema é que nós temos que fazer nos respeitar”, diz Lula. “Um delegado não pode desrespeitar um político, um senador ou um deputado! Sabe? Não tem sentido! Um cara do Ministério Público tem que respeitar! Todo mundo quer autonomia…. Quem está precisando de autonomia nesse pais é a DILMA! ”, completa o ex-presidente.

As frases não permite interpretação dúbia. Lula diz exatamente o que pensa: que os políticos estão ACIMA do Ministério Público, da Polícia Federal e de todos mais que trabalham para por à luz a estrutura criminosa montada pelo PT ao assumir o Poder federal. Que têm que ser “respeitados” por estes — ou seja, têm que permanecer intocados porque, com seus poderes divinos, não estão ao alcance da Justiça terrena. Menos ainda de seus executores.

Não é possível saber o que o ex-presidente quis dizer ao pugnar por autonomia para Dilma — seria autonomia para nomeá-lo ministro, livrando-o de ter que explicar as suspeitas que recaem sobre ele ?

Voltemos agora ao erro de Sérgio Moro. Um erro crasso como esse não pode ser explicado pela falta de preparo do julgador. Especialmente um juiz que tem tido 95 % dos atos que produz confirmados pelos tribunais. Que tem contra si a nata da advocacia brasileira — advogados que não conseguem sequer um habeas corpus nos tribunais superiores para livrar do xadrez gente da importância de um Vaccari, um Marcelo Odebrecht.

É tentador cair na corrente desse pequeno ribeirão de chorosos que atribuem o comportamento a uma suposta militância tucana do juiz de Curitiba para tentar entender suas ações. Mas a suspeita não se confirma, por mais que Moro tenha tido sua vida devassada por seus algozes sequiosos de descobrir algo que o incriminasse. Sem nenhum sucesso!

Então, por que Sérgio Moro finalmente ‘piscou’?

Ao liberar os sigilos e permitir a divulgação dos insidiosos diálogos mantidos por Lula e seu entorno, Moro despacha o seguinte:

“Tratando o processo de apuração de possíveis crimes contra a Administração Pública, o interesse público e a previsão constitucional de publicidade dos processos  impedem a imposição da continuidade de sigilo sobre autos“. O juiz paranaense enumera dois artigos da Constituição. O inciso LX do Art. 5º estabelece que “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”.

O Art. 93, em seu inciso IX, diz que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

Na minha opinião (lembro que sou apenas um modesto jornalista), os dois artigos explicam, mas também trazem problemas para as motivações do juiz. Acho que havia sim justificativas para a manutenção do sigilo ao menos em parte dos diálogos publicados. Um dos exemplo é a grosseira conversa em que a ex-primeira-dama Mariza Letícia sugere métodos heterodoxos para a utilização de panelas.

Mas a rigor, o prejuízo que decorreria do erro (deliberado) de Moro acaba se justificando plenamente pelo efeito que a divulgação dos grampos produziu no campo político.

A rigor, foi a liberalidade do juiz da Lava Jato que impediu que Lula se tornasse ministro, usurpasse o Poder e se tornasse um interventor branco, um governante de fato sem um voto sequer, sem escrúpulos de nenhuma ordem, acobertado por uma prerrogativa de foro que constitui um acinte para a Nação embasbacada.

Escondido por um governo que amealhou 54 milhões de votos de uma multidão de indigentes políticos (nem todos, alguns são apenas equivocados), Lula iria mudar sua história pessoal patrocinando uma nova fraude contra a história do Brasil.

Ministro plenipotenciário, presidente de fato, iria recorrer ao seu velho pragmatismo para uma vez mais conspurcar, com a distribuição de benesse estatais, o anseio de apuração que começa a se formar no Congresso. E não tenho dúvida de que faria isso com o mesmo ânimo ético que o levou à nomeação para a Casa Civil.

Então, Moro errou. E seu erro deixou o país prostrado. Moro quebrou, com a presunção do interesse público, o direito ao sigilo que assistia aos grampeados — entre eles inclusive a presidente que acolheu o ex no valhacouto do Planalto. Fez o direito da coletividade se sobrepor ao direito individual dos investigados e bisbilhotados.

Quanta dignidade houve nesse erro!

Agora, Moro vai ser provavelmente punido pelo Conselho Nacional de Justiça caso alguém represente contra ele. Que doce sentença! Qual o brasileiro que não gostaria de ter uma anotação dessas em seu curriculum ?

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